Carta à Merkel

Economistas pedem a Merkel que mude “política fracassada” para a Grécia. Em carta aberta à chanceler, economistas como Thomas Piketty e Jeffrey Sachs afirmam que austeridade “simplesmente não funcionou” e que “o remédio é pior que a doença”.

merkel_alexis
Economistas renomados pediram à chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, uma mudança no curso das políticas econômicas aplicadas na Grécia. Em carta aberta publicada em diversos jornais europeus nesta terça-feira (07/07), eles afirmam que as medidas de austeridade impostas ao país “simplesmente não funcionaram”.

O documento assinado por Heiner Flassbeck, diretor da Divisão de Globalização e Estratégias de Desenvolvimento da Unctad; Thomas Piketty, professor na Escola de Economia de Paris; Jeffrey D. Sachs, professor na Universidade Columbia; Dani Rodrik, professor na Universidade de Harvard; e Simon Wren-Lewis, professor em Oxford, alega que as exigências europeias impostas à Atenas só contribuíram para piorar ainda mais a situação no país, com consequências que não eram vistas desde as crises econômicas de 1929 e 1933.

“O remédio preparado em Berlim e Bruxelas é pior do que a própria doença”, afirmam os especialistas, na versão em alemão da carta, e pedem à Merkel uma correção no curso da austeridade para evitar danos maiores no futuro.

“No momento, o governo grego é obrigado a segurar um revólver contra a cabeça e disparar. Mas a bala não matará somente o futuro da Grécia na Europa. Os efeitos colaterais destruirão a zona do euro como farol da esperança, democracia e bem-estar. As consequências serão sentidas no mundo inteiro”, reforça a carta.

Os economistas lembram ainda que, na década de 1950, na criação da Europa, a Alemanha se beneficiou com o perdão da dívida econômica e agora é a hora de reestruturar a dívida grega, ao repensar a “fracassada política de austeridade”. Para isso, é necessário perdoar parte da dívida grega e, ao mesmo tempo, definir as reformas urgentemente necessárias na Grécia, afirmam os economistas.

“Senhora chanceler federal, nossa mensagem para a senhora é clara: nós pedimos que assuma um papel de liderança vital para a Grécia, para Alemanha e para o mundo. Suas ações desta semana entrarão para os livros de história. Contamos com a senhora para passos corajosos e generosos em prol da Grécia”, solicitam os economistas.

A carta foi publicada nos jornais Tagesspiegel, da Alemanha, Le Monde, da França, e The Guardian, da Inglaterra. Fonte: DW

  • Perdão de dívidas alemãs após Segunda Guerra gera polêmica em meio a crise na Grécia

O economista francês Thomas Piketty causou polêmica ao comentar as negociações sobre a crise grega em uma entrevista publicada pelo jornal alemão Die Zeit. (Clique aqui e leia a versão em inglês – Partes em português no fim do post)

Autor do best seller O Capital no Século XXI – onde faz fortes críticas ao que vê como desigualdades sociais inerentes ao capitalismo -, Piketty alfinetou as autoridades alemãs pela posição de não aceitar perdoar parte das dívidas gregas.

E o principal argumento do economista é que a Alemanha teria se beneficiado justamente de um expediente do gênero no pós-guerra.

Segundo o economista, se o mundo tivesse usado com a Alemanha o mesmo rigor que o país reserva à Grécia, é bem capaz que os próprios alemães tivessem demorado muito mais tempo para se recuperar da miséria em que se encontravam no final da Segunda Guerra Mundial.

Plano Marshall

Piketty não foi o único a usar o argumento. O historiador Albrecht Ritschl, da London School of Economics (LSE), escreveu sobre o assunto, mostrando que o perdão da dívida alemã equivaleu a 400% do PIB alemão em 1950 e estabeleceu os fundamentos para a recuperação financeira do país.

Mas há quem considere inválida uma comparação entre a Grécia de 2015 e a Alemanha de 1945.
Em 2012, Hans Werner-Sinn, diretor do Instituto Ifo, um renomado centro de estudos alemão, questionou a tese de Ritschl em um artigo no jornal The New York Times.

Ele argumentou que a Grécia, ainda durante os esforços de reconstrução após a Segunda Guerra Mundial, recebeu muito mais recursos de países europeus que a Alemanha durante os anos do Plano Marshall – um pacote de assistência pilotado pelos EUA que em números de hoje equivaleria a mais de US$ 130 bilhões.

Mas ninguém contesta que a Alemanha recebeu benefícios das potências ocidentais com o fim da Segunda Guerra Mundial. Apesar de arrasada pelo conflito, a Alemanha era de interesse estratégico para os EUA no momento em que tinha início a Guerra Fria com a União Soviética.

Em 1953, na Conferência de Londres, americanos e aliados como o Reino Unido decidiram perdoar quantidades substanciais das dívidas alemãs.

Um montante datava do final da Primeira Guerra, quando os alemães tinham sido obrigados a pagar grandes reparações de guerra às nações vencedoras.

O endividamento criou duras condições de austeridade econômica que contribuíram para ascensão do Partido Nazista, sob a liderança de Adolf Hitler, no início da década de 1930.

Analistas, no entanto, alegam que o socorro financeiro à Alemanha era uma necessidade que transcendia a geopolítica. Dado o tamanho do país, sua recuperação era importante para a economia mundial.

A Grécia certamente não tem essa importância, mas a dúvida aqui é se um colapso grego em 2015 apresenta os mesmos riscos políticos da Alemanha do pós-guerra.

E se o país “merece” a mesma generosidade dos credores. Fonte: BBC

  • Partes da entrevista de Thomas Piketty. (Tradução do Blog)

Desde seu livro de sucesso, “Capital do Século XXI”, o francês Thomas Piketty tem sido considerado um dos economistas mais influentes do mundo. Seu argumento para a redistribuição de renda e riqueza lançou uma discussão em todo o mundo. Em uma entrevista com Georg Blume do Die Zeit, ele dá suas opiniões claras sobre o debate da dívida europeia.

ZEIT: Nós, alemães, conhecemos nossa própria história.

Piketty: Mas não quando se trata de pagamento de dívidas! O passado da Alemanha, a este respeito, deve ser de grande importância para os alemães de hoje. Olhe para a história da dívida nacional: Grã-Bretanha, Alemanha e França já estiveram todos na situação da Grécia de hoje, e de fato estivera muito mais endividados. A primeira lição que podemos tirar da história da dívida do governo é que não estamos diante de um novo problema. Houve muitas maneiras de pagar as dívidas, e não apenas uma, que é o que Berlim e Paris tenta fazer os gregos acreditam.

ZEIT: Mas eles não deveriam pagar suas dívidas?

Piketty: Meu livro narra a história de renda e riqueza, incluindo a das nações. O que me impressionou enquanto eu estava escrevendo é que a Alemanha é realmente o melhor e único exemplo de um país que, ao longo de sua história, nunca pagou a sua dívida externa. Nem após a Primeira nem a Segunda Guerra Mundial. No entanto, tem frequentemente feito outras nações pagar, tal como depois da Guerra Franco-Prussiana de 1870, quando ela exigiu reparações maciças a partir da França e de fato recebeu. O Estado francês sofreu por décadas sob essa dívida. A história da dívida pública está cheia de ironia. Ele raramente segue as nossas ideias de ordem e justiça.

ZEIT: Mas, certamente, não podemos tirar a conclusão de que não podemos fazer melhor hoje?

Piketty: Quando ouço os alemães dizerem que mantêm uma postura de alta moralidade sobre a dívida e entendem fortemente que as dívidas devem ser pagas, pensei: é uma grande piada! A Alemanha é o país que nunca pagou suas dívidas. Ela não tem legitimidade para dar lições de moral sobre pagar dívida externas a outras nações.

ZEIT: Você acredita que nós, alemães, não são suficientemente generosos?

Piketty: O que você está falando? Generoso? Atualmente, a Alemanha está lucrando com a Grécia, uma vez que concede empréstimos taxas de juros comparativamente altas.

Deixe um comentário